Apesar do intenso calor desta época do ano (e especificamente do dia selecionado), a manutenção foi praticamente fechada em apenas um final de semana, com a ilustre participação do Carlos Carrozzino, um dos conquistadores.
A via Quarto Centenário (4° V E2 D1 - 175m) foi a primeira via conquistada no Morro da Babilônia (Urca / RJ), datada de 1965, sendo seu nome, uma alusão ao quarto centenário da cidade do Rio de Janeiro, comemorado naquele mesmo ano.
Seu estilo original era bem diferente do formato atual, sendo o traçado todo equipado com cabos de aço, técnica comum à época e que aos poucos, com a evolução do esporte, começou a cair em desuso (sendo mantidas algumas vias históricas, ou como direcionador para locais com elevada degradação).
Hoje em dia, a via é feita inteiramente em livre e conta com lances muito interessantes, verticais e, em geral, com boas agarras. O crux apresenta passadas mais técnicas, obrigando o escalador a selecionar bem os pontos de apoio, uma vez que estes se tornam mais escassos e menores neste ponto (início da terceira enfiada). Entretanto, a proteção é bem justa nos pontos mais críticos, conferindo um bom psicológico para quem decide escalá-la.
A maioria esmagadora dos grampos presentes na via, datavam da época da conquista, estando boa parte deles com o olhal bem para fora, apesar de não apresentarem sinais preocupantes de corrosão. Tendo isso em vista, unido ao fato de ser uma linha histórica, o Centro Excursionista Rio de Janeiro (CERJ), clube detentor da conquista, decidiu realizar a manutenção e modernização da via, no intuito de melhorar a segurança de quem a repete, além de proporcionar maior longevidade à via.
Para a empreitada, foi selecionado o final de semana dos dias 15 e 16 de dezembro (2018), sob coordenação minha e do Julio Mello. Nos auxiliariam, minha esposa Laura, os alunos do curso de guias do CERJ (Bruno, Stephanie, Kátia, Mariana, Bianca, Valéria, Caiê e Carlinha), os guias JP e Mirian, além da ilustre presença de um dos conquistadores da via, Carlos Carrozzino (o Karrô) e seu filho Gustavo.
O grande problema foi a época selecionada... o calor estava proibitivo, o que tornou o serviço bem mais exaustivo e demorado, do que deveria ter sido. Mas enfim...
Em verdade, o trabalho foi iniciado antes mesmo do final de semana, com Julio e Bruno realizando a manutenção das duas últimas enfiadas da via (45 metros, 11 grampos) e parte da terceira enfiada, já na sexta feira.
Sábado, foi a vez de grande parte do grupo de reunir sob o forte sol que fazia, já às 7h da manhã. Entrei na parede junto com Laura, o mais rápido possível, já prevendo um esforço grande, além de saber que submeteria minha "digníssima" à situações insalubres (rs...). Em poucos minutos já estávamos na terceira parada da via, carregando quilos de equipamento e pigando bicas de suor.
Por incrível que pareça, a maior parte dos grampos, mesmo os que estavam para fora, apresentaram uma enorme resistência ao serem arrancados. Alguns poucos (sobretudo - pasmem - os grampos mais recentes) foram fáceis de arrancar, mas nitidamente ainda tinham uma boa vida útil pela frente.
De todo modo, algumas passadas e paradas ficavam estranhas de fazer, com aqueles grampos por vezes com o tarugo com mais de sua metade para fora. As proteções adotadas foram as chapeletas PinGo, que apresentam a grande vantagem de serem rapeláveis, permitindo aos escaladores descerem de qualquer ponto da via, sem abandono de material.
Após fechar toda a terceira enfiada, parte da segunda e alguma coisa na primeira, voltei ao solo com a Laura, por volta das 11:30h, tendo arrancado 14 grampos e posicionado as novas chapeletas em seus devidos lugares. Além do calor infernal, a mão latejava com as bolhas de sangue estouradas. São as mazelas das manutenções...
Neste momento, alguns já haviam descido, enquanto que o grupo mais acima, ficou na parede até depois das 13h (não sei como aguentaram!), na tentativa de fechar toda a via, o que só acabou acontecendo no dia seguinte, com a investida coordenada novamente pelo incansável Julio, em companhia do Caiê, Carlinha e Bianca.
Alguns poucos grampos entortados (em outras manutenções mais antigas) não conseguiram ser arrancados e permanecem em alguns pontos, o que poderá ser solucionado no futuro com o uso de uma esmerilhadeira à bateria.
Todo equipamento foi cedido gentilmente pelo CERJ e pelo Julio Mello, sendo a modernização devidamente autorizada pelos conquistadores e realizada de forma inteiramente voluntária. Parabéns a todos os envolvidos e obrigado pelo carinho para com o montanhismo!
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